Mulher ao espelho
Hoje,
que seja esta ou aquela,
pouco
me importa.
Quero
apenas parecer bela,
pois,
seja qual for, estou morta.
Já
fui loura, já fui morena,
já fui
Margarida e Beatriz.
Já
fui Maria e Madalena.
Só não
pude ser como quis.
Que
mal faz, esta cor fingida
do meu
cabelo, e do meu rosto,
Se tudo
é tinta: o mundo, a vida,
o contentamento,
o desgosto?
MEIRELES,
Cecília. Mulher ao espelho. In:
Poesia Completa. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1973.
Vamos uma breve análise deste poema. A poeta Cecília
Meireles escreveu sobre temas fundamentais, como a instabilidade da vida e a
fragilidade do ser. Esta temática se apresenta no verso “Quero apenas parecer
bela, /pois, seja qual for, estou morta”; em que o desejo de ser bela denota
uma alusão nítida a fragilidade do ser humano, que busca demasiadamente a
beleza mesmo que custe a vida “pois, seja qual for, estou morta”. Vejamos que a
poeta anuncia de maneira peculiar a sua grande sensibilidade com os temas
existenciais como a velhice e a morte. Nesse sentido, a musicalidade e a
aparente espontaneidade de sua linguagem poética são fundamentais para que seus
textos abordem temas existenciais de maneira suave e delicada.
O poema de Cecília Meireles faz parte da primeira fase do
Modernismo. Observa-se que do ponto vista temático e formal, os poemas da
autora afasta-se dos textos dominantes da primeira fase do Modernismo. Do ponto
vista temático, o poema afasta-se dos textos dominantes na primeira fase do
modernismo porque desenvolve a temática existencial. Do ponto vista formal,
observa-se o emprego de versos rimados e metrificados, também incomuns nos
textos da primeira fase.
É possível afirmar que a perspectiva do eu lírico sobre a
sua própria experiência é melancólica, pois a voz que fala no poema diz que se
sente morta e que tudo – o mundo, a vida, o contentamento e o desgosto – são fingidos,
ou seja, falsos. Trata-se de uma perspectiva melancólica sobre a realidade
vivida.
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